terça-feira, março 18, 2014

Partículas de Momentos

A noite estava estrelada. O céu tinha uma cor de azul aveludado, parecendo um manto que cobria uma cama cheia de sonhos. Cada pontinho era uma nova vida longe dali. uma luz inspiradora, que transportavam qualquer um daquele lugar para outro melhor. As arvores elevavam-se no horizonte da noite, escondendo segredos sussurrados pelo vento. Na relva, um casal, duas almas, deixam-se perder no tempo, olhando para aquelas estrelas como se procurassem o seu futuro.

- Lembras-te da última vez que vimos as estrelas juntos?
- Lembro sim! Foi há tanto tempo...
- Há doze anos...
- Parece que foi há momentos atrás!
- Lembro-me do teu jeito desengonçado...
- Não vamos falar do passado!
- Sim, não falamos.

O silêncio era constrangedor mas era o melhor a fazer. Guardar para cada um deles aquilo que tinham sentido nesse velho rancho onde tinham acampado com amigos e se tinham conhecido. Ele lembrava-se bem da forma como se tinha apaixonado por aquele sorriso inocente. Já ela recordava os seus gestos meigos, sempre disposto a ajudá-la quando os outros se limitavam a tratá-la como apenas mais uma amiga do grupo. Antes de partirem, nesse ano, tinham ficado toda a noite a olhar para as estrelas, cada um à porta da sua tenda. Tinham medo de não se voltarem a encontrar. E não se encontraram... até àquela reunião de grupos do rancho de mil novecentos e qualquer coisa. Estavam diferentes, mas viviam tudo novamente.

- Como somos pequenos!
- É... poeira das estrelas.

Ele olhou-a sem medo. Ela não era poeira, era a estrela, e ele era a sua luz refletida. De que valia tentar viver o passado de uma outra forma? Queria-a a ela, ali e agora. E ela queria o mesmo. Viver. Agora não havia tendas. Haviam fugido da multidão para regressar àquele canto e ver agora com outros olhos aquilo que não tinha sido esquecido, apenas guardado. Deitados no chão, a única coisa que os unia eram as mãos dadas, entrelaçadas como o próprio tempo. Eram poeira, eram carne e sentimento.

- Ao menos somos reais... e estou feliz por estarmos aqui.
- Mesmo assim já foi tarde...
- Nunca é tarde quando é verdadeiro...
- E nunca acaba...

Foi ali mesmo que ambos se voltaram a apaixonar. As estrelas eram testemunhas e a imensidão da noite cobria-os com o manto do luar. Algumas estrelas cadentes correram por entre as árvores e cada um fez o seu desejo. Eternizar aquele momento, pensando no que viria a seguir. O passado já não interessava, apenas fazia parte deles. O que tinha sido vivido, jamais poderia ser roubado ou até apagado, por isso, interessava agora.

- E agora?
- Agora não sei... somos poeira das estrelas, por isso o vento irá levar-nos.
- Prometes não sair da minha beira?
- Prometo!

E aquela promessa nunca mais se quebrou. As noites sucederam-se, as estrelas continuaram a cair, o vento continuou a soprar e eles mantiveram-se lado a lado até ao último batimento dos seus corações, tornando-se assim em poeira.


Ana de Quina F.

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