Se tivesse um desejo, pedia que começasse agora a nevar. Que o céu se abrisse para deixar cair flocos brancos e que cobrisse os meus pés com um manto branco. Desejava que fosse noite escura, iluminada por àrvores cobertas de luzes coloridas. Que o frio me fizesse aconchegar nos agasalhos quentes e que me fizesse esquecer os meus sentimentos. Que me congelasse a alma, o corpo, o sangue, mas nunca o coração. Desejava poder percorrer quilometros a fio sem qualquer compromisso, sem tempo para contar, sem tempo para me controlar, sem tempo para regressar. Deitaria fora todos os relógios e não deixaria a manhã chegar. Seguiria cada passo ao meu próprio ritmo e não colocaria qualquer espectativa no imprevisto.
Se tivesse um desejo, pedia que me roubasses um beijo, para me aquecer a alma. Que valesse por todos aqueles que foram dados de forma mais contida ou mais ponderada. Que me pegasses nos teus braços e me aquecesses com o teu abraço. Desejava que caminhasses do meu lado, também sem tempo e principalmente sem esperares nada em troca, quer de mi, quer de ti. Que me pegasses na mão e não a deixasses, mesmo que o frio nos parecesse cortar à faca. Desejava contar-te todos os meus segredos, todos os meus sonhos, todos os meus medos. Tornar-te no meu anjo da guarda, sem asas e com os pés bem presos no chão. Desejava que o inverno ficasse, que o verão não voltasse, que não fosses embora.

Se tivesse um desejo, pedia que me transformasse em neve, para cair em cima do teu ombro e caminhar contigo para o desconhecido. É certo que derreteria, que me iria dissipar na atmosfera, mas certamente que me iria transformar em mais e mais flocos. Desfragmentar-me-ia em quantas partes fossem precisas para seguir os teus passos. Se tivesse um desejo, pedia para ser o chão que pisas, o ar que respiras, o abraço invisivel dado no silêncio da solidão, a mão que aquece as tuas no inverno, o raio de sol que te aquece no verão. Pedia para deixar de ser eu, para me poder completar em ti.
Se tivesse um desejo pedia à noite para namorar o dia, para não o deixar aparecer. Pedia ao frio para amenizar o seu vento, para abraçar o calor e à neve que caisse calma e lentamente. Pedia à escoridão que colocasse no meu caminho velas que não se apagassem e pedia ao céu que te trouxesse novamente até mim.
Ana de Quina F. (2014)
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